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      Heba Ayyad

      Jornalista internacional e escritora palestina

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      Ajuda ou armadilha? As três tentativas fracassadas dos EUA em Gaza

      Os Estados Unidos continuam afirmando que não buscam matar civis em Gaza, mas sim fornecer-lhes ajuda humanitária

      Palestinos carregam suprimentos de ajuda que receberam da Fundação Humanitária de Gaza, apoiada pelos EUA, no centro da Faixa de Gaza, em 29 de maio de 2025 (Foto: REUTERS/Ramadan Abed)

      Três tentativas dos Estados Unidos de fornecer ajuda humanitária aos sitiados em Gaza foram alvo de uma saraivada de bombas e projéteis norte-americanos, fornecidos ao exército do assassinato e do massacre. Trata-se da brutalidade dos poderosos, que não se importam com direitos, justiça ou leis. O que eles promulgam torna-se lei, e o que rejeitam, espera-se que o mundo também rejeite.

      Além dos bilhões de dólares fornecidos pelos Estados Unidos à entidade sionista, o país abriu seus armazéns de armas, equipamentos e munições — ultrapassando cem mil toneladas de explosivos, o suficiente para fabricar dez bombas atômicas do tipo lançado sobre Hiroshima e Nagasaki.

      Ainda assim, os Estados Unidos continuam afirmando que não buscam matar civis em Gaza, mas sim fornecer-lhes ajuda humanitária, e seguem elogiando o profissionalismo de Israel e sua suposta determinação em não alvejar civis.

      Os Estados Unidos lançaram uma campanha midiática massiva na tentativa de convencer o mundo de sua solidariedade com os civis, especialmente as crianças, por meio de uma série de iniciativas estranhas e mortais. Isso os forçou a recuar diante de uma enxurrada de críticas severas de organizações humanitárias. Mencionarei três tentativas, todas fracassadas, que ceifaram sua parcela de vidas inocentes na Faixa de Gaza.

      A Primeira Tentativa: Lançamento Aéreo de Ajuda

      Em março de 2024, os Estados Unidos começaram a lançar pacotes de ajuda alimentar para a população sitiada e faminta da Faixa de Gaza, após cinco meses de cerco, assassinatos, destruição, deslocamentos forçados e prisões em massa. O Comando Central dos EUA assumiu a responsabilidade por essa operação. O número de lançamentos aéreos chegou a 40.

      As pessoas observavam o espaço aéreo de onde caíam bombas estadunidenses, agora na esperança de que pudessem cair pacotes de ajuda alimentar. Bombas para matá-los e alimentos para adiar a matança — até que as bombas atingissem suas casas, suas crianças e suas tendas.

      No entanto, o método de lançamento dos pacotes, feito de grandes altitudes, provocou a ira de organizações humanitárias, que criticaram a prática aleatória. Essa ação gerou um caos incontrolável e permitiu que homens mais fortes se apropriassem da ajuda, deixando para trás mulheres, crianças, idosos, feridos e pessoas com necessidades especiais.

      O lançamento foi aleatório, já que não havia um ponto específico de recepção, nem organização prévia. Depois, o processo foi transferido às organizações humanitárias da ONU, como se essa falta de coordenação tivesse sido deliberada. Muitos pacotes caíram sobre as cabeças da multidão que corria para receber a ajuda, matando dezenas de pessoas, gerando pânico entre a população e provocando apelos internacionais pelo fim dessa prática incivilizada.

      Diante da onda de críticas severas, o governo dos EUA foi forçado a interromper a operação. A situação mobilizou os membros do Conselho de Segurança da ONU a redigir uma resolução exigindo acesso imediato e irrestrito à ajuda humanitária, um cessar-fogo e a libertação de prisioneiros. Essa proposta foi posteriormente incorporada à Resolução 2735, aprovada em 10 de junho, com o representante dos Estados Unidos votando "abstenção". 

      A Segunda Tentativa: O Porto Flutuante

      Em meados de março de 2024, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, anunciou sua decisão de estabelecer um porto flutuante na costa de Gaza, com o objetivo de entregar ajuda humanitária aos sitiados na Faixa. O Exército e a Marinha dos EUA foram encarregados da construção do porto, que levou aproximadamente dois meses para ser concluída, ao custo de 230 milhões de dólares. Sua finalização foi anunciada em 16 de maio de 2024.

      A construção do porto foi acompanhada por uma ampla campanha midiática, como se essa iniciativa fosse aliviar o sofrimento da população de Gaza. No entanto, as forças americanas anunciaram que o porto enfrentava dificuldades devido às fortes ondas do mar. Para compreender isso, é necessário considerar sua fragilidade estrutural: a Faixa de Gaza jamais havia experimentado ondas tão violentas em sua história moderna. Nada foi registrado sobre isso, tampouco há relatos orais de nossos ancestrais sobre tamanha turbulência na costa leste do Mediterrâneo — seja na Palestina, no Líbano ou na Síria.

      Mas, durante a presidência de Biden, o Mediterrâneo aparentemente decidiu desencadear ondas tempestuosas contra o porto flutuante, que nasceu e morreu em apenas vinte dias.

      Mais tarde, descobriu-se que forças israelenses secretas estavam escoltando caminhões do porto até os centros de distribuição. Alegava-se que membros da resistência estavam em um desses centros. Foi então que os militares israelenses explodiram o local, abriram fogo e cometeram um massacre brutal, posteriormente apelidado de Massacre de Nuseirat, no qual mais de 200 palestinos — em sua maioria mulheres e crianças — foram mortos.

      O pessoal estadunidense que operava o porto, juntamente com a célula dos EUA que colaborava com as forças israelenses desde 7 de outubro de 2023, forneceu informações sobre alguns dos reféns. As forças de ocupação sionistas conseguiram capturar quatro prisioneiros em troca desse massacre.

      Mais tarde, foi revelado que o porto flutuante fazia parte de um plano israelense malicioso para infiltrar-se no centro de abrigo, coletar informações sobre membros da resistência e identificar prisioneiros. Após a conclusão da operação, os quatro prisioneiros foram libertados, os civis foram mortos, a missão do porto foi considerada concluída — e ele foi desmantelado, como se nada tivesse acontecido. Nunca mais se falou sobre isso.

      A Terceira Tentativa: A Fundação Humanitária de Gaza

      No início de maio de 2025, Israel, em cooperação com os Estados Unidos, estabeleceu a chamada "Fundação Humanitária de Gaza", que montou quatro centros para distribuir cestas básicas. Instituições estadunidenses foram designadas para gerenciar a operação, caracterizada pelo caos: pessoas famintas corriam até os centros de distribuição e eram recebidas com balas reais — nas primeiras, segundas e terceiras posições. 

      Essa evidência conclusiva demonstrou que a cooperação entre os EUA e Israel não tinha como objetivo salvar civis, mas sim eliminá-los. O Boston Consulting Group foi encarregado de gerenciar a organização, mas a renúncia de seu diretor, Jake Wood — ex-fuzileiro naval que serviu no Iraque e no Haiti — marcou o início da desintegração da operação.

      A organização também enfrentou duras críticas internacionais, especialmente por parte do secretário-geral da ONU, António Guterres, e do coordenador humanitário, Tom Fletcher. O Boston Consulting Group e seus consultores se retiraram da operação na última sexta-feira, após a renúncia de dois de seus altos executivos.

      Os pontos de distribuição tornaram-se armadilhas, resultando na morte de dezenas de palestinos famintos pelas forças de ocupação israelenses. Descobriu-se ainda que toda a operação tinha uma finalidade de segurança: Israel, por meio da fundação, buscava identificar todos os que solicitavam ajuda, utilizando inteligência artificial como ferramenta para infiltrar-se nas fileiras da resistência.

      Israel recrutou um grupo de agentes liderados por Yasser Abu Shabab, que apareceu armado nas proximidades dos quatro centros de distribuição, a fim de fornecer a Israel um pretexto para atirar na multidão — sob a alegação de que elementos armados do Hamas pretendiam tomar os armazéns e os suprimentos alimentares ali contidos.

      A família Abu Shabab divulgou um comunicado que circulou nas redes sociais, anunciando a rejeição ao filho, Yasser Abu Shabab, e declarando que seu sangue era permissível, após a confirmação de sua colaboração com a ocupação.

      As Nações Unidas se recusaram a cooperar com a organização, afirmando, em inúmeras declarações, que ela carecia de neutralidade, profissionalismo e objetividade, além de desviar a atenção do que era realmente necessário. Israel cometeu ao menos três massacres durante tentativas de acesso aos centros de distribuição. A organização e sua equipe foram dizimadas — assim como o porto flutuante e a operação de lançamento aéreo de cestas básicas.

      * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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